MEUS LÁPIS DE COR SÃO SÓ MEUS
Ruth Rocha
Ruth Rocha
A Lulu estava muito contente naquele dia.
É que era o dia do aniversário dela.
Quando ela chegou da escola já encontrou a mamãe preparando a festa.
O bolo já estava pronto, os brigadeiros, as balas e os pirulitos.
O papai estava enchendo as bolas e a tia Mari estava botando a mesa na sala.
Todos almoçaram na cozinha para não atrapalhar as arrumações.
Então Lulu tomou banho e vestiu sua roupa nova, que a mamãe tinha comprado para ela. E se arrumou toda e a mamãe botou nela um pouquinho de água de colônia.
O primeiro convidado que chegou foi o priminho da Lulu, o Miguel.
Depois chegou a Taís, o Arthur e o Caiã e todos os colegas do colégio.
E ficaram todos brincando no jardim.
Aí todos entraram para abrir os presentes.
Depois foram soprar as velinhas e cantar parabéns.
Lulu gostou de todos os presentes, mas o que ela mais gostou foi da caixa grande de lápis de cor que se abria feito uma sanfona e que tinha todas, mas todas as cores, mesmo.
Depois que todos foram embora a Lulu foi dormir e ela até botou a caixa de lápis de cor do lado da caminha dela.
Então, logo de manhã, a Lulu já se sentou na mesa da sala, pegou o bloco grande de desenho e começou a fazer um desenho bem bonito, com seus novos lápis. Aí chegou o Miguel, que veio passar o dia com ela.
Ele se sentou junto da Lulu e disse que também queria desenhar.
Mas Lulu não quis nem por nada emprestar os lápis a ele.
- Os meus lápis de cor são só meus! – ela disse.
A mãe de Lulu ficou zangada:
- Que é isso, minha filha? Os dois podem desenhar muito bem. Empreste os lápis para o seu primo!
Mas o Miguel já estava enjoado dessa conversa, e foi para fora andar de bicicleta.
A Lulu desenhou casinhas e desenhou bonecas e desenhou um pato e um elefante. E pintou todos os desenhos com seus lápis novos e mostrou para a mamãe. Mamãe disse que estavam todos ótimos, mas que ela guardasse os desenhos e os lápis que ela precisava preparar a mesa para o almoço.
A Lulu juntou todos os lápis, mas, em vez de guardar na caixa, que é o melhor jeito para se guardar lápis, ela botou os lápis em cima do bloco e foi para o quarto, equilibrando tudo.
Ela foi subindo as escadas, subindo as escadas, até que já estava chegando lá em cima, quando ela perdeu o equilíbrio e deixou os lápis caírem todos escada abaixo. Os lápis rolaram pela escada e foram batendo, batendo, batendo nos degraus.
A Lulu desceu as escadas e viu que todas as pontas dos lápis estavam quebradas. Então ela começou a chorar, que os lápis estavam estragados e que nunca mais ela ia poder desenhar. O Miguel, que estava brincando lá fora, veio correndo apara ver o que tinha acontecido.
Então ele disse à Lulu:
- Não chore não, Lulu, eu vou buscar meu apontador lá em casa e eu aponto todos os seus lápis. E ele foi e logo ele chegou com o apontador.
O Miguel apontou todos os lápis da Lulu.
Então a Lulu convidou:
- Miguel, você não quer desenhar comigo?
E o Miguel veio e eles fizeram uma porção de desenhos, e o Miguel ensinou a Lulu a fazer um automóvel e a Lulu ensinou o Miguel a fazer um elefante. Aí o Miguel ensinou a Lulu a fazer um foguete que voava direitinho. E a Lulu ensinou o Miguel a recostar umas bonecas engraçadas.
E a Lulu se divertiu muito mais do que quando ela ficava desenhando sozinha...
Maluquinha, eu?
Eu não! Não sou nenhuma maluquinha!
Quem me pôs esse apelido foi aquele menino de casacão e panela na cabeça.
Ele me botou esse apelido quando eu fui brincar na casa do Mauricinho.
Eu nem queria ir.
Mas a mãe dele telefonou pra minha mãe, ela disse que o Mauricinho era muito tímido e que ela queria que ele brincasse com umas crianças mais... Não sei o que ela disse, acho que ela queria que ele brincasse com umas crianças mais descoladas...
E aí minha mãe me encheu um pouco e eu acabei indo.
A gente chegou na casa do Mauricinho e foi logo almoçar.
E depois do almoço a mãe dele botou a gente pra fazer a lição.
Eu não me incomodo de fazer lição logo depois do almoço, porque eu fico logo livre.
Mas a mãe do Mauricinho começou a fazer uns discursos sobre responsabilidade e coisa e tal, que a gente já era grandinha e tinha que cumprir com os compromissos... Um saco!
Eu tô careca de saber disso!
E então eu fiz minha lição correndo e o Mauricinho ficou lá toda a vida, ele não acabava mais de fazer a lição dele.
Aí eu comecei a rodar pela casa até que encontrei um gato.
Gato não, gata. Chamava Pom-pom. Ou era Fru-fru... Ou era Bom-Bom, sei lá.
E eu peguei a gata e ela estava meio fedida.
Então eu resolvi dar um banho nela. Gato não gosta de banho, vocês sabem.
Mas meu avô tinha me contado que quando ele queria dar banho no gato ele botava o bicho dentro da banheira e ele não conseguia sair e meu avô dava banho à vontade!
Mauricinho tinha um banheiro dentro do quarto dele.
Quando eu fui chegando perto da banheira a gata arrepiou toda e eu joguei ela bem depressa lá dentro e tapei o ralo e enchi de água.
E esfreguei a gata todinha com um shampoo todo perfumado que tinha lá e eu estava achando que todo mundo ia gostar de ver a gata toda limpinha. A gata estava muito infeliz e ela miava miaaauuu... e tentava sair do banho, mas meu avô tinha razão: ela arranhava a parede da banheira, mas não conseguia sair.
Mas acho que aí caiu shampoo no olho da gata, porque ela deu um pulo e agarrou na minha roupa e conseguiu pular fora e saiu correndo, espalhando espuma de shampoo por todo lado e nisso a mãe do Mauricinho vinha chegando e levou o maior susto e caiu sentada e a gata continuou correndo e assustando todo mundo e respingando tudo de espuma.
Eu não sei quem estava mais assustado: se era o Mauricinho, a mãe dele, a gata, ou se era eu.
Eu corri atrás da gata, mas ela pulou pela janela, atravessou o jardim, saiu pela rua e eu atrás.
Só que no meio da rua estava a turma daquele menino, aquele da panela na cabeça, e a gata passou pelo meio deles todos e eu atrás!
E eles levaram o maior susto, cada um correu para um lado, e atrás de mim vinha a mãe do Mauricinho e o Mauricinho e a cozinheira e o jardineiro todos correndo e gritando e eu resolvi correr para a minha casa e me esconder lá.
Mas no dia seguinte... a escola toda já sabia da história e aquele menino, aquele da panela na cabeça começou a me chamar de maluquinha...
Mas eu não sou maluquinha, não! Só se for a vó dele!
Uma vez um vaqueiro por nome de Pedro se empregou num convento de irmãos. De tanto lidar com os frades, Pedro foi ficando muito amigo deles.
De todos os irmãos, Pedro gostava mais era de frei Damião, o mais sábio de quantos sábios havia no convento.
Frei Damião sabia da chuva e sabia do sol.
Sabia das colheitas e das semeaduras.
Sabia de histórias de reis e de rainhas, de cavaleiros e damas, de castelos e de dragões. Frei Damião sabia de tudo!
A fama do frade acabou chegando no palácio do rei.
E o rei ficou curioso para conhecer frei Damião.
E mandou chamá-lo, porque queria lhe fazer três perguntas.
Os reis, antigamente, parece que não tinham nada para fazer.
Então eles gostavam muito dessas histórias de fazer perguntas pra ver se as pessoas sabiam as respostas. Perguntavam umas perguntas muito sem jeito, que ninguém entendia direito. E se as pobres vítimas não sabiam responder, tome castigo!
Frei Damião foi se preparando para ir falar com o rei.
Mas Pedro estava com muito medo:
- Frei Damião – ele disse – o senhor não devia de ir, não. Eu sou um roceiro, muito do ignorante, mas eu conheço esses reis. Eles querem perguntar umas bobagens pro senhor. E se o senhor não responder do jeitinho que eles gostam, o senhor está perdido!
- Que é isso, meu filho? – o frei espantou-se. - Eu só posso responder ao rei as coisas que eu sei. E quem diz a verdade não merece castigo! Todo mundo sabe!
- Todo mundo, menos o rei! Essa gente poderosa não quer ouvir a verdade, não! O que eles querem é uma mentirinha bonitinha, engraçadinha, que agrade a eles. Sabe de uma coisa, frei? Eu é que vou no seu lugar! O rei não conhece o senhor. Ninguém na corte conhece o senhor. Eu me disfarço de frade e vou. Garanto que vou saber as respostas que o rei quer.
Frei Damião não permitiu de jeito nenhum que Pedro fosse. Mas, de madrugada, Pedro saiu bem de mansinho, sem que ninguém visse, e foi para a corte vestido de frade.
O rei recebeu Pedro muito bem e nem desconfiou de nada:
- Muito bem, frei Damião, está pronto para responder às minhas perguntas?
Pedro fez que sim com a cabeça.
Então o rei começou:
- Está vendo aquele morro, detrás do meu palácio?
Pedro olhou pela janela e viu.
- Pois me diga, meu bom frade, quantos cestos são precisos para carregar toda aquela terra para o outro lado do palácio?
Pedro fingiu que estava pensando, mas por dentro ele estava era rindo:
- Depende, Majestade!
- Depende de quê, frei Damião?
- Pois depende do tamanho do cesto, Majestade. Se o cesto for do tamanho do morro, basta um. Se for a metade do morro, é preciso dois.
O rei ficou embasbacado. Nunca ninguém tinha conseguido responder àquela pergunta. Mas ele não podia responder que estava errado. Então pensou, e tornou a perguntar:
- Pois me diga lá, meu bom irmão, onde é que fica o centro do universo?
Pedro sabia muito bem que ninguém tinha ideia de que tamanho era o universo, quanto mais onde era o centro...
Mas ele sabia, também, que os reis são muito convencidos e acham que são a coisa mais importante do mundo.
Então Pedro, muito sem-vergonha, respondeu:
- Ora, meu rei, essa pergunta é fácil! Todo mundo sabe que o centro do universo é onde está sua Majestade...
O rei ficou todo prosa pela resposta de Pedro e começou a achar que aquele fradinho era muito sabido, mesmo. E ele veio com a pergunta mais difícil de todas:
- Vamos lá, me responda, frei Damião, o que é que eu estou pensando?
No que o rei perguntou, Pedro coçou a cabeça, olhou de lado pro rei e mandou:
- Vossa Majestade está pensando que eu sou o frei Damião, mas sou é o vaqueiro dele.
Foi uma risada só. Todos na corte acharam tanta graça que o rei não teve outro remédio senão rir também.
E deu a Pedro uma porção de presentes e mandou que ele fosse em paz.
Quando Pedro chegou ao convento, encontrou todo mundo muito preocupado.
Frei Damião já estava se preparando para ir atrás dele.
- Que é que houve, homem? Eu já estava ficando assustado com a sua demora.
Pedro sorriu, passou a mão na sua violinha e começou a cantar:
“Quem possui muito poder
Abusa de toda gente.
Por isso, a gente que é fraco,
Tem de ser inteligente...
Não adianta ter razão,
Não adianta estar certo.
Pra vencer certas pessoas
É preciso ser esperto!”
Como se Fosse Dinheiro
Todos os dias Catapimba levava dinheiro para escola para comprar o lanche.
Chegava no bar, comprava um sanduíche e pagava seu Lucas.
Mas seu Lucas nunca tinha troco.
Um dia, Catapimba reclamou de seu Lucas:
- Seu Lucas, eu não quero bala, quero meu troco em dinheiro.
- Ora, menino, eu não tenho troco. Que é que eu posso fazer?
- Ah, eu não sei! Só sei que quero meu troco em dinheiro!
- Ora, bala é como se fossa dinheiro, menino? Ora essa...
Catapimba ainda insistiu umas duas ou três vezes.
A resposta era sempre a mesma:
- Ora, menino, bala é como se fosse dinheiro... Então, leve um chiclete, se não gosta de bala.
Aí, Catapimba resolveu dar um jeito.
No dia seguinte, apareceu com um embrulhão de baixo do braço. Os colegas queriam saber o que era. Catapimba ria e respondia;
- Na hora do recreio, vocês vão ver...
E, na hora do recreio, todo mundo viu.
Catapimba comprou o seu lanche. Na hora de pagar, abriu o embrulho. E tirou de dentro... uma galinha.
Botou a galinha em cima do balcão.
- Que é isso, menino? - perguntou seu Lucas.
- É pra pagar o sanduíche, seu Lucas. Galinha é como se fosse dinheiro... o senhor pode me dar troco, por favor?
Os meninos estavam esperando para ver o que seu Lucas ia fazer.
Seu Lucas ficou um tempão parado, pensando...
Aí colocou uma moedas no balcão:
- Está aí seu troco, menino!
E pegou a galinha, para acabar com a confusão.
No dia seguinte, todas as crianças apareceram com embrulhos debaixo do braço.
No recreio, todo mundo foi comprar lanche.
Na hora de pagar...
Teve gente que queria pagar com raquete de pingue-pongue, com papagaio de papel, com vidro de cola, com geleia de jabuticaba...
O Armandinho quis pagar um sanduíche de mortadela com o sanduíche de goiabada que ele tinha levado...
Teve gente que também levou galinha, pato, peru...
E, quando seu Lucas reclamava, a resposta era sempre a mesma;
- Ué, seu Lucas, é como se fosse dinheiro...
Mas seu Lucas ficou chateado mesmo quando apareceu o Caloca puxando um bode.
Aí, seu Lucas correu e chamou a diretora.
Dona Júlia veio e contaram pra ela o que estava acontecendo.
E sabe o que ela achou?
Pois achou que as crianças tinham razão..
- Sabe, seu Lucas - ela falou -, bode não é como se fosse dinheiro. Galinha também não é. Até aí o senhor tem razão. Mas bala também não é como se fosse dinheiro muito menos chiclete.
Seu Lucas se desculpava:
- É, mas eu não tive troco?
- Aí, o senhor anota, e no outro dia paga.
Os meninos fizeram uma festa, deram pique-pique pra dona Júlia e tudo.
Naquele dia, nem houve mais aula.
Mas o melhor de tudo é que todos do bairro ficaram sabendo do caso.
E, agora, seu Pedro da farmácia não dá mais comprimidos de troco, seu Ângelo do mercado não dá mais mercadoria como se fosse dinheiro.
Afinal, ninguém quer receber um bode em pagamento, como se fosse dinheiro. É, ou não é?
Todos os dias Catapimba levava dinheiro para escola para comprar o lanche.
Chegava no bar, comprava um sanduíche e pagava seu Lucas.
Mas seu Lucas nunca tinha troco.
Um dia, Catapimba reclamou de seu Lucas:
- Seu Lucas, eu não quero bala, quero meu troco em dinheiro.
- Ora, menino, eu não tenho troco. Que é que eu posso fazer?
- Ah, eu não sei! Só sei que quero meu troco em dinheiro!
- Ora, bala é como se fossa dinheiro, menino? Ora essa...
Catapimba ainda insistiu umas duas ou três vezes.
A resposta era sempre a mesma:
- Ora, menino, bala é como se fosse dinheiro... Então, leve um chiclete, se não gosta de bala.
Aí, Catapimba resolveu dar um jeito.
No dia seguinte, apareceu com um embrulhão de baixo do braço. Os colegas queriam saber o que era. Catapimba ria e respondia;
- Na hora do recreio, vocês vão ver...
E, na hora do recreio, todo mundo viu.
Catapimba comprou o seu lanche. Na hora de pagar, abriu o embrulho. E tirou de dentro... uma galinha.
Botou a galinha em cima do balcão.
- Que é isso, menino? - perguntou seu Lucas.
- É pra pagar o sanduíche, seu Lucas. Galinha é como se fosse dinheiro... o senhor pode me dar troco, por favor?
Os meninos estavam esperando para ver o que seu Lucas ia fazer.
Seu Lucas ficou um tempão parado, pensando...
Aí colocou uma moedas no balcão:
- Está aí seu troco, menino!
E pegou a galinha, para acabar com a confusão.
No dia seguinte, todas as crianças apareceram com embrulhos debaixo do braço.
No recreio, todo mundo foi comprar lanche.
Na hora de pagar...
Teve gente que queria pagar com raquete de pingue-pongue, com papagaio de papel, com vidro de cola, com geleia de jabuticaba...
O Armandinho quis pagar um sanduíche de mortadela com o sanduíche de goiabada que ele tinha levado...
Teve gente que também levou galinha, pato, peru...
E, quando seu Lucas reclamava, a resposta era sempre a mesma;
- Ué, seu Lucas, é como se fosse dinheiro...
Mas seu Lucas ficou chateado mesmo quando apareceu o Caloca puxando um bode.
Aí, seu Lucas correu e chamou a diretora.
Dona Júlia veio e contaram pra ela o que estava acontecendo.
E sabe o que ela achou?
Pois achou que as crianças tinham razão..
- Sabe, seu Lucas - ela falou -, bode não é como se fosse dinheiro. Galinha também não é. Até aí o senhor tem razão. Mas bala também não é como se fosse dinheiro muito menos chiclete.
Seu Lucas se desculpava:
- É, mas eu não tive troco?
- Aí, o senhor anota, e no outro dia paga.
Os meninos fizeram uma festa, deram pique-pique pra dona Júlia e tudo.
Naquele dia, nem houve mais aula.
Mas o melhor de tudo é que todos do bairro ficaram sabendo do caso.
E, agora, seu Pedro da farmácia não dá mais comprimidos de troco, seu Ângelo do mercado não dá mais mercadoria como se fosse dinheiro.
Afinal, ninguém quer receber um bode em pagamento, como se fosse dinheiro. É, ou não é?
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